Brasília ainda canta alto: Quando um palco é uma praça e o rock insiste em viver

Por Thiago Ciarlini (@thiago_ciarlini)
Dizem por aí que o rock morreu. Outros, mais ousados, juram que ele está apenas adormecido, esperando que alguém lhe dê um novo fôlego. Mas em Brasília, cidade de traços retos e corações inquietos, o rock não apenas vive — ele resiste.
Resiste nos bares, nos porões, nas praças e nos pulmões de quem ainda acredita que música não é produto, é expressão. E que, mesmo sem uma banda completa ou um palco iluminado, é possível transformar a rua em templo, e a arte em resistência.
Na Praça 101 Norte de Águas Claras, todas as quintas-feiras, na feira gastronômica da praça Tiê, o cantor Samuca Vox dá uma aula dessa filosofia. Com um setup instrumental pré-produzido, sua guitarra na mão e a alma na voz, ele entrega clássicos do rock com uma presença que dispensa a companhia de uma banda. O que Samuca faz é simples, mas poderoso: devolve à música o que ela precisa — sentimento, coragem e identidade.
Siga-o no Instagram @samuca_vox
A capital do rock não é lenda. É persistência
Brasília nunca foi só política. Desde os anos 1980, quando o rock nacional buscava sua linguagem própria, a capital federal foi mais que palco: foi berço, laboratório e trincheira sonora. De lá saíram Legião Urbana, Capital Inicial, Plebe Rude, Raimundos — nomes que ainda ecoam em corações de várias gerações.
E hoje, mesmo com uma presença mais discreta de bandas de rua de rock do que em cidades como Curitiba, Brasília ainda entrega sua riqueza musical em novos formatos. Quem busca, encontra.
A cidade conta com uma Rota Turística do Rock, com 41 pontos históricos mapeados — do apartamento onde viveu Renato Russo, na SQS 303, ao antigo Food's da 110/111 Sul, passando pela Colina da UnB, onde os primeiros acordes da rebeldia brasiliense ecoaram. Cada local recebeu uma placa com QR Code, permitindo que visitantes leiam e vivam a história do gênero que deu alma à capital.
Do bloco à praça: onde encontrar o rock de rua
Além da história, Brasília ainda pulsa em diferentes ritmos e esquinas. Para quem quer sentir o rock na pele, algumas dicas:
Blocos de carnaval como o Eduardo e Mônica transformam as letras da Legião Urbana em sambas e batucadas que emocionam.
Parques e áreas de lazer, como o Parque da Cidade, recebem músicos independentes que misturam voz e violão com a autenticidade do improviso.
Lojas de discos e materiais musicais frequentemente abrem espaço para apresentações autorais e covers criativos.
E claro, as redes sociais são uma ferramenta preciosa: muitos artistas de rua divulgam suas agendas por lá.
Paulo Mesquita: a chama continua acesa
Se Samuca representa o rock que brota da calçada, Paulo Mesquita é o som que ecoa dos palcos com elegância e fúria dos anos 80.
Comandando bandas como Paulo Mesquita e Os Brancos, U2 Elevation e Cadillac BSB, ele reafirma a força do artista que não desiste, não cansa, não se dobra. Seu repertório combina clássicos do rock com composições autorais afiadas — um verdadeiro presente para o público brasiliense e goiano.
Siga-o no Instagram: @paulomesquitacantor
Afinal, o que é boa música?
Boa música não é medida por aplauso fácil nem por algoritmos. Ela é medida pela verdade que carrega.
E Brasília ainda é lar de artistas que entendem isso. Covers, quando feitos com alma, deixam de ser repetição e passam a ser releitura viva. E músicas autorais, quando honestas, são gritos de quem ainda acredita.
A boa música resiste. Mesmo sem estrutura. Mesmo sem patrocínio. Mesmo sem holofotes. Ela resiste porque há quem insista.
Em tempos líquidos, o rock é rocha
Em um mundo apressado, onde as faixas duram 30 segundos e tudo é feito para viralizar, artistas como Samuca e Paulo nos lembram que persistir na música é um ato de amor e coragem.
E estes são apenas dois exemplos da boa música feita com paixão. Seja um artista solo que transforma uma praça em palco, seja um cantor com sua banda mantendo viva a chama do autoral — o importante não é o número de integrantes no palco, mas a força daquilo que se entrega.
Porque, no fim das contas, covers nem sempre são apenas covers. Quando a essência da boa música ebuli, quando há alma envolvida, a canção renasce, e o público sente.
Então vá. Saia de casa. Ouça. Sinta. Descubra.
O próximo grande show pode estar a poucos metros de você, esperando um olhar atento e um ouvido disposto.
Em Brasília, o rock ainda vive.
E em cada esquina, praça ou memória, há uma nota pronta para acordar quem quiser ouvir.